sexta-feira, 29 de maio de 2015

Fósseis e Minerais

"É possível que seja verdade o que dizem: 
estes fragmentos de rocha quebrada 
sorriram um dia e verteram lágrimas. 
Nesta escura mancha de carvão, 
provável brasa, agora, de estufa ou braseiro, 
habitaram, povoados e rumorejantes 
ramos, pássaros - agudos incansáveis trinados, 
expostos à luz ardente da primavera. 
A vós, pedras, contemplo, esquecendo fastidiosas descrições 
fósseis cobertos de fino pó, surpreendentes formas. 
Quero crer que nem tudo está morto, 
que um latejo de longínqua irmandade nos convém ainda. 
Viro as costas a uma cautelosa vigilância 
toco por um instante a vossa presença mineral 
aquilo que talvez tenha sido 
um trémulo peito de mulher ou áspera e vingativa mão. 
fugaz cansaço, incompreensível eternidade. 
É difícil aceitá-lo à luz do pálido esplendor 
que a cortina coou, imaginar os vossos desejos, 
as desajeitadas carícias, os vossos gritos de rebeldia face ao destino 

Passam rapazes de olhar enjoado, 
estudantes apressados, intratáveis guardiões. 
Volto, perseverante, a observá-los. Desejaria falar convosco 
mas onde encontrar a palavra, a cálida sílaba que embeba 
de humanos tremores o vosso coração disforme -
cerrada matéria emudecida. Ouve-se logo uma campainha 
soam palmas imperiosas, é chegada a hora do adeus. 
Enquanto lentamente caminho para a saída, 
para o sol nublado de uma manhã de Dezembro, 
penso em nós, insensíveis próximos, 
talvez nunca vencidos pela terra, 
pois dela sois certeira semelhança. 
Imagino-vos mais poderosos que o tempo não temido, 
porque espíritos, plantas, hoje 
me dais testemunho do seu inútil domínio."

Juan Luis Panero

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